Ali Bjur

sábado, março 31, 2007

O assento

E todos os dias, milhares de brasileiros assistem à televisão, a televisão que mostra o lavrador que começou a vender pamonha na beira da estrada, e com isso conseguiu comprar uma fazenda e uma casa, a dona de casa que com um real no bolso começou a fazer tapioca e a vender no bairro, comprou duas casas e hoje as aluga.

"Você pode conseguir. Depende exclusivamente de você. Se ele conseguiu, porque você não pode conseguir também?" ou "Você é vagabundo. Está nessa situação porque quer. Meus pais nasceram pobres, tinha dia que não comia, mas mesmo assim me criaram com dignidade. Eles nunca reclamaram da situação que estavam. Dependia somente deles. Você é vagabundo."

É a imagem de ascensão para todos, que todos tem as mesmas oportunidades, que vende a televisão que lembrava o povo que estava "tudo bem" em plena ditadura há alguns anos. É a imagem que o capitalismo é bom, e que melhora, depende de você e de mais nada. O conformismo e o exemplo para sempre trabalhar e não querer mudar o molde, mas sim, ser moldado por ele. Quem sabe, mas quem sabe mesmo, você pode ser um exemplo destes, e finalmente, contribuir para a aceitação deles.

"Não há motivos para parar, não há motivos para querer mudança. Eu posso melhorar minha vida. É o que me dizem, o que querem que eu entenda. - O pouco de muitos viabiliza o muito de poucos. - Eu cumpro meu papel, e muito bem por sinal. Vai começar o programa.".

São as cidades que maqueiam as favelas. As pessoas que não só isolam seu cotidiano como ignoram o mundo à sua volta. As pessoas que dormem. As pessoas que não saem às ruas. As pessoas que Não saem às ruas! O povo. O Molde.

Ali.

quinta-feira, março 22, 2007

Lago Walden


Nas chamadas comunidades primitivas e mitológicas, os índios em suas malocas, por exemplo, gozavam de pleno conforto e tranqüilidade. Não existiam abrigos (casas) ruins ou tampouco uma tão boa ao ponto de se diferenciar entre as demais. Esses povos se preocupavam apenas com sua subsistência e espiritualidade, diferenciando-se não pelo que tem, mas pelo que representa à comunidade. É um exemplo de grupo que vivia em total harmonia com o ambiente, e seu modo simplista e despojado, os tornavam capazes de serem hóspedes da natureza.


Em nossa sociedade ‘desenvolvida’ e ‘ideal’, somos escravos de preconceitos. Nunca algo irá chegar a um patamar tão elevado, de modo que agrade ou satisfaça a todos. Não existe, por exemplo, casa ou carro suficientemente ideal. ‘Na maioria das vezes, somos levados mais pelo gosto da novidade e respeito à opinião alheia do que pela verdadeira utilidade’. Não consideramos a verdadeira natureza das coisas, mas sim a falsa utilidade ou necessidade de tê-la. Criamos nossas desigualdades e estamos adormecidos o suficiente para ignorá-la. ‘Estar acordado é estar vivo. Até agora nunca encontrei um homem inteiramente acordado. Como poderia tê-lo encarado?’.


Vivemos de modo estúpido. O que é verdadeiramente essencial de modo que nenhum outro homem poderia viver sem? Acumulamos entulhos desnecessários e nos prendemos a eles. Homens ricos não são sabiamente acolhidos pelos seus bens e confortos, mas estupidamente prisioneiros de seus prazeres e desilusões. A verdadeira riqueza de um homem é proporcional à quantidade de bens que pode se esvair sem o mínimo de esforço ou ressentimento. ‘Não há ninguém feliz no mundo, a não ser os seres que gozam livremente de um vasto horizonte. ’. Acordar com tais privilégios, cabe a poucos.


“Porque teríamos de viver com tanta pressa esbanjando a vida? Decidimos morrer de fome antes de sentir fome.”

Referência a Thoreau.

Ali.

terça-feira, março 13, 2007

Sempre há um muro


Sempre há dois lados para serem separados. Não preciso citar o que está acontecendo. Olho para o lado, e o que vejo é um muro. Em todos os sentidos concretos e metafóricos, um muro indica muito bem a doença que vivemos diariamente. Somos prisioneiros de uma sociedade doente, todos já nos sentimos assim. E se quisermos cruzar o muro, ao menos um pouco de coragem é preciso. É uma relação de medo e repúdio, e inveja e ódio. Uma herança de uma história corrompida, cicatrizes e doenças que perseguem gerações de dor. Angústia de lidar com um mundo traiçoeiro.

Existem vários mundos. Sempre um muro. Não importa onde mora, o reconhece. Temos mundos despreocupados, protegidos e felizes. Mundos vendidos com cachorros em um campo verde, crianças quase sempre loiras, sorrindo e abraçando seus pais. Talvez uma dessas crianças nunca tenha espiado o outro lado do muro. Muro que o cerca e está ali para você lembrar. Olhamos sempre, vimos a toda hora, mas nem sempre acordamos para o que ocorre. Somos essa criança, podemos olhar e ao mesmo tempo não ver.

Não atravesse o muro, não queira estar lá. Ninguém tem olhos para essa gente. - Temos medo, me entenda, o melhor remédio é o isolamento. É a maneira rápida, fácil e sustentável para esse mundo. Os muros crescem. Quem se importa com os outros? Chame a Vovó e o Cooper. Hoje teremos um almoço especial. Comprei aquele presentinho que havia lhe prometido. -

Tudo é muito intenso. Mutável em uma velocidade assustadora. Você se lembra onde estava a quinze anos? Talvez cinco? Conte-me! Como era? Dois séculos, apenas dois séculos e não podemos calcular os danos. E daqui a dois? Não precisamos de tudo isso. Como estaremos daqui a meio século?

O prazer supera a razão, confunde os pensamentos e enfraquecem os nossos corações. A verdadeira transformação começa conosco, com a sua vontade. Todos precisam de momentos para pensar sobre onde vivemos. Se estamos satisfeitos ou não, procurar a quem culpar, a quem recorrer, a quem ajudar e a quem confiar. Temos sempre dois olhares sobre a mesma história, dois lados, dois certos e dois errados. Temos sempre uma doença. Cure-a.

O discurso aqui, mudou seu tom. Todos somos os mesmos, mas diferentes ao mesmo tempo. Desculpe a intensidade.

Ali.